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Por Alberto e Anna

 

Mendigos?

Dezembro 2005 - Cabo Verde

Tínhamos chegado ha pouco tempo a Cabo Verde e não era muito fácil ler correntemente os jornais locais, escritos em português. Nos chamou a atenção o título de um artigo e, lendo o texto, percebemos que o jornalista tratava de "mendigo" o primeiro-ministro. A pergunta, nas primeiras linhas, era extremamente direta:

"é possível que os caboverdianos, desde um menino de rua até o primeiro-ministro, devam mendigar sempre ?"

O raciocício que se seguia corria perfeitamente nos trilhos da lógica e da realidade. A comparação entre o menininho que recorre ao turista para ter uma caneta ou que mendiga uns escudos, e o primeiro-ministro que exibe as ajudas humanitárias dos Estados Unidos como um resultado do qual se orgulhar, ainda que forçado, era proponível. O artigo era "pesado", de alguma forma ofensivo até, mas, até onde sabemos, não suscitou nenhuma reação.

Se podemos apreciar o fato em termos de liberdade de imprensa (Cabo Verde tem estatisticamente uma imprensa mais livre do que a da Itália), na época sinceramente nos surpreendeu esta aceitação, ainda que de uma situação de qualquer modo evidente. Naturalmente ainda não compartilhávamos essa ótica então, e muito menos a compartilhamos hoje, ainda que... não podemos negar que a economia deste País tenha, como entradas de dinheiro mais importantes, as ajudas humanitárias e as remessas de dinheiro dos emigrados. É verdade também que o País não tem recursos e que é independente somente há trinta anos, depois de séculos de escravidão e de colonização, mas talvez finalmente chegou a ocasião e a hora de arregaçar as mangas e tornar-se dono do próprio futuro.

O momento é favorável, na nossa opinião.Comecemos a elencar alguns dados *:

- A população de Cabo Verde é de somente 436 mil habitantes (como Gênova), espalhados por nove ilhas (na realidade mais da metade da população habita na Ilha de Santiago);
- A idade média da população é de 28 anos e mais de 41% tem menos de 14 anos;
- O turismo, até o momento, é somente o organizado por Sal e Boavista, completamente em mãos de estrangeiros e só recentemente empreendedores e construtores italianos construíram pequenos condomínios em Maio, mas...
... depois de uma gestação de anos, eis que finalmente abre, dois meses atrás, o Aeroporto Internacional de Praia.

Um fato novo, que permanece ignorado, não muda uma vírgula na economia caboverdiana, mas que se for adquirido com consciência pelos caboverdianos (os na pátria e os imigrados) pode realmente fazer voar uma nova economia. Se trata unicamente de aproveitar a publicidade que no mundo turístico Cabo Verde já conquistou no curso dos anos, e valorizar as ilhas nas quais o turismo de massa ainda não tomou conta.

Os recursos humanos para contar na força de trabalho são uma premessa, faltam os capitais mas é hora dos emigrados entenderem que não podem se limitar a mandar dinheiro para a pátria para sustentar jovens desocupados da família, ou financiar a construção da casa para assegurar um lar no momento da pensão. Cabo Verde precisa do dinheiro deles próprios agora, de todo o dinheiro possível, para financiar a receptividade, ligações e transportes. Os empreendedores locais (poucos, mas existem) devem "quebrar o porquinho", comprar menos jipes foras-de-estrada vistosos, parar de almoçar regados a whisky e começar a investir em algo de útil para o País. Terão com certeza um retorno econômico, farão trabalhar seus filhos, mas sobretudo deixarão de ser parasitas de um sistema que põe todas as alavancas econômicas e financeiras nas mãos de estrangeiros !

Somente a consciência e o aproveitamento desta oportunidade podem, finalmente, dar a liberdade à este povo. A liberdade de viver, de desenvolver-se, de considerar a miséria somente uma recordação do passado. De calar, de uma vez por todas, quem o considera um povo de mendigos! (trad. Fabio Luiz Braggio)

* Dados estatísticos tirados do Censo 2000

 

Lágrimas de dor: quem são os cabo-verdianos?

Novembro 2005 - Cabo Verde

Falemos um pouco deste povo, nascido em 1975, ano da Independência, depois de uma centena de anos de escravidão e de colonização portuguesa (talvez pior que a escravidão). Os guias turísticos o descreve como cordiais, alegres, sempre disponíveis, festivos.. É mesmo assim? Após anos vivendo neste País, temos razões para duvidar.

Os homens e mulheres cabo-verdianos são produtos de sua própria historia e de sua Cultura (e, poderia ser de outro jeito?).
O caráter isolado, esquivo , essencial mistura-se àquele de submissão no confronto com os brancos, com os ricos, com os poderosos dos quais lhes será difícil livrar-se ainda por décadas. Nos locais turísticos pode-se encontrar pessoas prontas, disponíveis (quase sempre jovens) que nos parece a quintessência da espontaneidade. Saibam que, quase sempre, trata-se de uma farsa, uma fachada devida à necessidade de parecer aquilo que gostaríamos que fossem. Convém a nós, turistas (para o sucesso de nossas férias), convém a eles que conseguem, com as migalhas deixadas pelo turismo organizado, a sobreviver.

O homem cabo-verdiano tem uma seriedade advinda do conhecimento da vida, da dureza da sobrevivência, da pobreza que conhece desde a infância e que se perpetua nos hábitos familiares. Não é, portanto, cordial: é simplesmente respeitoso. Não confia imediatamente. Prefere avaliar seu interlocutor e o faz à uma distância segura. Muitas vezes teve amargas surpresas com os brancos, ricos e poderosos para que pudesse ter confiança incondicionalmente.

Se puder ouvir a música tradicional de Cabo Verde detenha-se a apreciar uma "Morna". Encontra-se todas as características do Cabo-verdiano: um misto de ternura, tristeza, alegria, felicidade e desconsolo que, além de fazer parte da vida de cada ser vivente, são a essência do verdadeiro sentimento de cada habitante desta ilha. A sociedade cabo-verdiana e, quase maciçamente, dividida em duas: de um lado os pobres (mas não desesperados, gente que, simplesmente, sobrevive com nada), do outro lado os ricos (não necessariamente brancos) que talvez tenham perdido seu sentimento tradicional. Duas sociedades que raramente se tocam, que têm seus rituais, ritmos, "necessidades" e problemas completamente diferentes.

De qualquer modo, é chegado , provavelmente, o momento de superar, de uma vez por todas, a busca pelo paraíso terrestre, do bom selvagem, do "ser" simples, espontâneo e portanto perfeito nos sentimentos, no caráter (e, oxalá no físico). Os humanos são imperfeitos e por isso mesmo maravilhosos em sua diversidade. Os cabo-verdianos, ao nosso modo de ver, têm muitas qualidades (senão não haveriamos escolhido este lugar para viver) mas são perfeitamente consciente de que a vida (sobretudo a vida deles, que é, quase sempre uma existência na pobreza) é luta, alegria mas, muito frequentemente, também tristeza. Sabe-o muito bem aquele pescador que deu nome ao seu barco: "Lágrimas de dor". (trad. Aldo della Monica)

 

Turismo equivocado

Outubro 2005 - Cabo Verde

O "turismo de massa", irmão gêmeo da globalização, leva individuos iludidos a achar que todos os países do mundo são semelhantes a um mesmo modelo. A falta de conhecimento da geografia, a vontade de tirar férias, a impossibilidade de organizar-se (devido à falta de tempo), faz com que, à última hora, se recorra a Agências ou Operadores de Turismo com a questão: "aonde vou nas minhas férias? Onde vou encontrar ofertas convenientes ?" E são as agências que, respondendo à solicitação, oferecem o melhor que possuem: "férias na Ilha de Cabo Verde".

Ilha de Cabo Verde? Sal , naturalmente. Há anos os operadores italianos de turismo (um em particular) tentam, a despeito da geografia, convencer a todos que existe uma única ilha de Cabo Verde e que esta é Sal. Para dizer a verdade, recentemente alguém tentou fugir desta "sindrome de Orwell" demonstrando que existe também Boa Vista, um pouco distante... O esforço já está em andamento mas não se pode dizer que tenha sido coroado de sucesso.

Entretanto, felizmente, sempre existe alguém que, antes de fazer uma reserva (ou imediatamente após), volta para casa e, na Internet ou em um velho Atlas, descobre que existe, até mesmo, um "arquipélago" de Cabo Verde! Cerca de dez ilhas, das quais nove habitadas, com uma historia sofrida, uma população nos limites da pobreza, nenhum recurso econômico, mas maravilhosa em sua natureza e na absoluta diversidade.

A mesma agência havia proposto soluções diferentes, todas tropicais: Sharm el Sheik, Cuba, Rep.Dominicana, Cabo Verde.... Esqueceram-se de dizer (ou, talvez não sabiam) que, em Cabo Verde, o mar é "oceano de verdade" e não existe barreira de corais. Portanto, de superfícies móveis e ondas imprevisíveis e inconstantes mas também com sabor de mar verdadeiro, vivo.

Assistência sanitária? Nenhum problema. Cada aldeia ou pousada tem um médico próprio. Nada mais falso! Se você encontrar um doutor na sua pousada será, provavelmente, um turista como você.

A realidade é bem diferente:

Cabo Verde não tem estrutura sanitária comparável ao padrão europeu e também é bem distante do padrão do continente Africano.

Os únicos dois hospitais, pouco dignos desse nome, estão na Praia (Santiago) e em Mindelo (S.Vicente). Em todas as outras ilhas existe apenas um Posto de Saúde (pouco mais que um ambulatório médico).

Felizmente não existem doenças endêmicas, o clima seco é bom para a saúde e os riscos de se adoentar são infinitamente pequenos.

Pois bem, devemos confessar que, como velhos viajantes, temos uma imagem romântica da Agência Turística.

Há quarenta anos, jovens e desprovidos, nos dirigíamos ao empregado que perdia horas para encontrar aa passagem aérea mais em conta para a India, Madagascar, Nepal... Para ele era uma brincadeira e nós o observávamos fascinados quando pegava o telefone ou solicitava uma confirmação telegrafada. Outros tempos, é verdade!

Mas a agência de turismo, quem sabe uma franquia, administrada por pessoas que nunca viajaram (e/ou não têm qualquer intenção de viajar) parece-nos verdadeiramente fora de qualquer lógica humana e comercial. Julgamos também que o inevitável encontro entre viajantes (férias no exterior em um país exótico, tido com um simbolo de "status") e um agente improvisado (e/ou incompetente) seja uma mistura verdadeiramente explosiva que não favorece ninguém. Criam-se, quase sempre, espectativas frustradas e litigiosas entre as partes: certamente também não favorece aos países para os quais se dirije esse fluxo turístico...

Mas, este é um outro discurso… (trad. Aldo della Monica)


Investimentos imobiliários em Cabo Verde

Setembro 2005 - Cabo Verde

Nos chegam notícias difíceis de acreditar, de um País como a Italia em crise. De pessoas vivendo na pobreza e em estado de indigência, de famílias que não conseguem chegar até o final do mês com seu salário. Vivendo em Cabo Verde há mais de quatro anos, nos é muito difícil acreditar, visto a grandeza dos "investimentos financeiros" destinados no campo imobiliário deste País.

Sal e Boavista (mas recentemente também Maio), as duas ilhas descobertas pelo turismo de massa, são literalmente invadidas pelos italianos. Trata-se de empreendedores, construtores, operadores turísticos ou especuladores que vêm neste novo empreendimento imobiliário e no baixo custo da mão de obra local aquela oportunidade que na pátria deles não tiveram (ou tiveram com êxito desastroso!). E é assim que cada vez mais, pessoas envolvidas pelos baixos preços (temos certeza de que sejam realmente baixos?) e das estórias contadas dos maravilhosos trópicos e de praias encantadas, compram um imóvel sem nunca ter ido em Cabo Verde…

A promessa é clara: baixo preço de compra, elevada rentabilidade (quando não é usada), reavaliação segura com o tempo.
Considerando que é simplesmente loucura comprar um imóvel num país que não se conhece (sobretudo se for do "terceiro mundo"), analisamos uma série de problemas que possam surgir e indicamos as precauções a serem seguidas.

Investir com tranqüilidade em Cabo Verde não é fácil. Não existe um registro imobiliário adequado e portanto, mesmo estando em possesso de uma regular escritura de compra, corre-se sempre o risco de processos com herdeiros, supostos ou reais, de "proprietários" emigrados ao exterior no passado. Ao se adquirir um imóvel, aconselhamos que seja assegurado que quem vende seja realmente o proprietário do bem e quando da efetivação do compromisso e eventual antecipação, citar e anexar os relativos documentos que comprovam a propriedade em questão.

O ideal seria limitar o uso de instrumentos como compromisso, escritura privada, promessa de venda e antecipações relativas e efetuar o pagamento somente no momento da venda e diante do oficial do cartório. O fato que o imóvel exista, que tenham sido pagos direitos (taxas e/ou impostos) na Prefeitura e que a mesma tenha deliberado e concedido uma licença de construção em nome de alguém, não significa praticamente (ou quase) nada.

Com isto não queremos dizer que não se possa investir (comprar um terreno ou um imóvel) em Cabo Verde. Recomendamos somente muita cautela e circunspecção. Sobretudo lembrando que comprando de alguém de pele branca, talvez um Italiano, não se tem nenhuma garantia do que comprando de alguém local!!

Gostaríamos de terminar este artigo salientando a profunda diversidade entre se viver num país do terceiro mundo e os regulamentos do ocidente aos quais estamos abituados. Quando vivemos num "vilarejo turístico" ou em um confortável hotel, inclusive com a fórmula "tudo incluso", por uma semana gozamos de espécie de extra-territorialidade. Somos pessoas privilegiadas que tocam apenas (ou quase nada) a realidade do País. Comprando un imóvel passamos a fazer parte daquela realidade… querendo ou não! (trad. Anna Grazia Barbaro)

 

Ribeira Grande: ressurge uma cidade

Agosto 2005 - Cabo Verde

Provavelmente era um dia do ano de 1462 quando duas caravelas da marinha Portuguesa ancoraram na Baía de uma terra desconhecida, na embocadura de um verde e profundo vale. Umas das embarcações era comandada pelo português Diogo Gomes, a outra pelo italiano Antonio da Noli.

A versão de mais crédito (e talvez mais fantasiosa) dos fatos conta que os dois almirantes tiraram a sorte para decidir quem tomaria posse da terra em nome da Coroa Portuguesa. A Sorte escolheu Diogo Gomes. Mas a caminho de volta os ventos favoreceram a embarcação de Antonio da Noli, o qual ao chegar em Portugal declarou ter descoberto o novo arquipelago.

E assim, Antonio da Noli (italiano patrocinado pela Coroa portuguesa - Noli é uma cidadezinha localizada a poucos quilometros de Savona, em Liguria) ficou sendo o descobridor oficial das ilhas de Cabo Verde. Dois anos mais tarde nascia no local do desembarque a primeira cidade fundada pelos Portugueses na Africa: Ribeira Grande.

Mais de cinco séculos se passaram desde então.
Ribeira Grande teve seus períodos de esplendor e seus constantes períodos de decadência (vide: http://www.cvfaidate.com/ribeira.htm). Há alguns anos, Cidade Velha (ex - Ribeira Grande) encontrava-se num estável lastimável de deterioração. Os monumentos irreconhecíveis e depredados, pareciam um monte de pedras desiguais. A historia de um país jazia abandonada e sepultada.

Há alguns anos a "Cooperação Espanhola" se encarregou da reconstrução, ou melhor da recuperação. As intervenções quase sempre são discutíveis, sobretudo no método e na forma, mas hoje podemos dizer que o aspecto da cidadezinha é bem diferente. A recuperação das fachadas externas das casas de frente para o mar, da capela do Convento franciscano e outras intervenções menores restituiram decididamente um núcleo agradável e interessante para a meta turística e cultural.

Restam os problemas para os abitantes que, na maioria das vezes não possuem água, luz e nem serviços higiênicos em casa, mas a Cooperação Espanhola assegurou que em breve se ocupará também deste aspecto inadiável.

Hoje, agosto 2005, a Cidade Velha (rebatizada Ribeira Grande) é reconhecida oficialmente como Município. Amanhã com a abertura do aeroporto internacional de Praia (atual Capital, a 12 quilômetros) será uma meta turística de primeira linha. A cidade renascerá e se o centro histórico (que prestes fará parte do Patrimonio da Unesco) a preservar da especulação edil, talvez se torne ponto de encontro de pessoas e populações diferentes… desta vez livres e não como escravos…(trad. Anna Grazia Barbaro)

 

A nova colonização

Julho 2005 - Cabo Verde

Em Cabo Verde sempre existiu problemas de carência de água. As periódicas secas sempre fizeram com que a população diminui-se. O primeiro e dramático período de seca, do qual temos notícias concretas, é de 1747. Seguiram-se outras, com intervalos de tempo cada vez mais curtos. Calcula-se que entre os anos de 1773 e 1776, houve uma perda de 44% da população; 42% entre os anos de 1830 e 1833 e 40% entre 1863 e 1866.

No século passado, nos anos 20 e 40: com o regime colonial português, a única alternativa contra fome e a morte era a emigração voluntária (para os USA e Europa) ou através de acordos ("contratados") para as outras colônias: São Tomé, Angola. Outra trufa do colonizador branco que, ao invés de ajudar a própria colônia em dificuldade, deporta (desta vez enganosamente), por interesse pessoal, inteiras populações com o sonho de uma vida melhor.

Acesso a Bens de Conforto (% da população de Cabo Verde)
Fonte : Censo 2000

Casa Própria 64%
Água canalizada da rede pública 24,8%
Cozinha 65,2%
Banho 38,7%
Gás para preparar alimentos 64,3%
Fossa séptica 14,9%
Electricidade 50%
Rádio 65,9%
Televisão 39,7%
Frigorífico 33,5%
Automóvel 7,3%

Nos dias atuais: Cabo Verde é um país independente, mas pobre. Carente de energia e água, necessárias para sua sobrevivência, necessárias para o seu próprio desenvolvimento ou, pelo menos, para manter uma esperança de desenvolvimento. Na ausência de soluções internas e estatais (por falta de capital), a solução mais lógica é aquela de se dirigir ao mercado financeiro externo. Os portugueses que nunca esqueceram os países de Língua Portuguesa, mas esquecendo a história e calúnias passadas, estão prontos para ajudar o "país irmão com o qual compartilham interesses e histórias comuns".

Nasce a Electra que conforme ao seu sito:

- produz e distribui eletricidade em todo o Paíse;
- produz e distribui água para o consumo humano nas ilhas de São Vicente, Sal, Boavista e na cidade de Praia;
- armazena e trata águas residuais na cidade de Praia.

No mesmo site descobrimos que:

- um bloco (indivisível) de 51% de ações da Electra è detido por um grupo direto da EDP - Eletricidade de Portugal S.A. (30,6%) e integralizado pela ADP - Águas de Portugal (20,4%).
- 34% é detido pelo Estado de Cabo Verde.
- 15% é dividido entre dezessete Município das várias ilhas.
Nesta situação e com esta divisão de capital (e portanto com este peso de poder contratual), chegamos hoje a braço de ferro entre Electra e Estado de Cabo Verde com relação a falta de investimentos que prejudicam o normal fornecimento dos serviços. A água, a luz, às vezes há falta de ambas por horas; às vezes por dias. Se sucedem as acusações, os jornais falam tudo e o contrário de tudo, o pobre cidadão é confuso: de quem é a culpa? A quem dirigir-se para impor as próprias razões?

As poucas empresas artesanais, as pouquíssimas fábricas estão paradas. Os mantimentos e as mercadorias que dependem de refrigeração e nos frigoríficos dos comerciantes varejistas, atacadistas, hotéis e restaurantes se deterioram. Quem paga por este desastre todo? Paga Cabo Verde; mais uma vez condenada a um subdesenvolvimento do qual não consegue se liberar.

Uma notícia recente (confortante?!). Electra e o Governo fizeram um acordo. Qual? Impossível saber. Uma das cláusulas do acordo determina que os termos do mesmo não devem ser divulgados. Outra trama às custas do povo caboverdiano? (trad. Anna Grazia Barbaro)

 

Um País oculto

Junho 2005 - Cabo Verde

Os guias turísticos de Cabo Verde relatam um país com pouco artesanato, vida cultural escasso, pouca arte ou quase inexistente.
Somente a música é citada, não obstante o limitado número de artistas (entre os quais a "divina" Cesaria Evora). O turista, o viajante, quem vive ocasionalmente em Cabo Verde, aos poucos se adapta a esta "realidade" com resignação. Levará consigo ou para os amigos, ao voltar para casa, somente uma garrafa de vinho de Fogo, uma lata de atum ou… algum objeto artesanal proveniente do então vizinho Senegal.

Somente vivendo por um longo tempo neste país percebemos que a realidade é completamente outra. A descoberta se dá gradativamente, quase por acaso. Vivendo em Cabo Verde notamos que quase todos os artigos de uso comum, dos alimentos aos "supérfluos", inicialmente considerados inexistentes, existem, é só procurá-los. A propaganda é praticamente desconhecida, as vitrines quase inexistentes são sempre cercadas por grades. Pode acontecer, por exemplo, de entrar numa loja que (milagrosamente) tem uma placa escrita "Tabacaria" e na realidade trata-se de uma loja de roupas. Por que? Certamente antes havia uma loja que vendia tabacos….

Neste caso é a propaganda boca a boca que resolve todos os problemas. É só perguntar: ao vizinho, ao passante, a uma loja qualquer. Todos darão indicações úteis com eficácia e precisão. A vossa vida, de repente, se tornará mais fácil e com certeza terá tudo próximo.

Este maravilhoso País é assim! É discreto, reservado, escondido… sem ostentar nunca nada...como se tivesse um certo pudor em se mostrar, em mostrar suas coisas, os seus pensamentos, a sua cultura, o seu artesanato, a sua arte…
Tudo é oculto: seus tecidos (Panos), a sua cerâmica, os produtos de sua medicina popular, os cestos de folha de palma trançada… os batiques e as telas de seus artistas…

São raros os pratos da cozinha caboverdiana nos restaurantes. A "katchupa", prato pobre e o único permitido à maioria da população, lhes será oferecido por um preço exorbitante; em restaurante para turistas, raramente serão encontrados outros pratos típicos como a caldeirada, o cabrito ou as especialidades locais. E também neste caso, o turista deixará o país convencido de que a cozinha caboverdiana não oferece outra coisa senão pratos cozidos e improvisados numa grelha à beira da estrada…

Freqüentemente fala-se de viagem para "explorar" um país, seus costumes, seu povo. Este termo nunca foi tão pertinente e apropriado como para Cabo Verde. Nada é oferecido ao viajante apressado, não há nada próximo… Neste país, somente com dedicação, espírito de observação, serenidade e sobretudo tempo seremos recompensados amplamente! (trad. Anna Grazia Barbaro)

 

Uma Política de "Estádio"

Maio 2005 - Cabo Verde

Cabo Verde é um país maravilhoso, clima fantástico, absoluta tolerância religiosa, pouca xenofobia (só um pouco, em relação aos negros africanos), democracia parlamentar, eleições livres a cada cinco anos. Dois grandes partidos possuem a liderança no poder. Talvez seja útil, para compreender o sistema político caboverdiano, dar uma repassada na história, partindo dos dias da independência:

-1975 Cabo Verde conquista a sua independência perante Portugal (que em 1974 havia visto a revolta dos Capitães ao regime de Salazar). O PAICV (de inspiração comunista, herdeiro do PAIGC que administrou a oposição à potência colonial) assume o poder e o conserva por dezesseis anos, instaurando um regime de Partido Único;

-1991 Após quinze anos, os tempos amadureceram primeiro para as eleições livres e depois para a independência. Uma parte dos políticos se desliga do Partido e funda o MPD, que logo se declara de inspiração liberal e abre Cabo Verde aos capitais e à especulação dos investidores estrangeiros;

-1996 Vence mais uma vez o MPD que governa bem ainda por mais três anos. Nos últimos dois anos do mandato, talvez com receio de uma troca de governo nas eleições sucessivas, comete vários "erros", vendendo o país aos estrangeiros (através de privatizações selvagens) e permitindo o enriquecimento ilícito de uma pequena minoria da população (governantes, financiadores, burocráticos);

-2001 Troca de guarda. Vence efetivamente o PAICV por um punhado de votos.

-2005 estamos próximos de uma nova eleição e se faz necessário, além de um balanço dos cincos anos que se passaram, um exame do amadurecimento adquirido de um país e da população nestes anos de regime democrático.

As eleições em Cabo Verde, e certamente todos já entenderam como funcionam, se vencem (ou se perdem) por um punhado de votos. É assim que cada partido ao poder trabalha, nos anos de governo, exclusivamente em chave própria e "pro domo sua". Governa como se a oposição não existisse, não respeitando seus compromissos, não cumprindo suas promessas.
Os simpatizantes, os votantes, os aderentes àquele partido possuem uma fé absoluta em seus governantes, os quais assim que eleitos são inacessíveis aos cidadãos comuns e são considerados pela população como uma espécie de semideus. Fazer parte de "um partido" significa ter "fé no partido". Uma fé que vai além de qualquer tipo de espírito crítico, uma fé que justifica tudo. O partido é como o próprio time do coração: não pode errar, não pode perder e se perder é culpa do juiz!

A semelhança com o futebol pode continuar falando da campanha eleitoral. Os fãns de um time ou de outro ostentam os "gadget" (bonés, camisetas, chaveiros, etc…) com os símbolos do partido e o nome dos candidatos. Mas, de onde vem o dinheiro? Perguntemo-nos quem os patrocina: não estamos num país pobre de terceiro mundo que vive exclusivamente de ajuda humanitária e de remessas dos emigrantes!? Os Partidos "inventam" as festas e recorrências das mais fantasiosas para oferecer gratuitamente bebidas à população aclamadora. Os muros são pintados com verniz e manifestos (permanecerão assim até a próxima consulta eleitoral!).

Chega-se assim às eleições, em uma atmosfera festiva, ao som de musica altíssimo até o raiar do dia, garrafas e cacos de vidro espelhados pelas ruas. Na hora da contagem dos votos, as eleições não interessam mais à minoria da população (aquela que votou). De agora em diante a questão é de competência dos Políticos, dos Poderosos. Inicia-se então as acusações de trapaças e trufas. De maneira pacata, como é da índole dos caboverdianos, entende-se, mas sem a exclusão de golpes. Haverão acusações como: erros de contagem, oferecimento de dinheiro em troca de títulos eleitorais e documentos de identidade, votos de pessoas já falecidas. A contagem se prolonga, os ânimos se aquecem, mas … sem medo… acabará logo … alguém governará nos próximos cinco anos e o cidadão, pobre embriagado, voltará a beber por sua conta, reservando as próprias emoções ao Benfica ou ao Porto. (trad. Anna Grazia Barbaro)

 

Este "Turismo" desconhecido

Aprile 2005 - Cabo Verde

Onde se localiza Cabo Verde?

Se perguntarem a uma Agência terão a sensação que se trata de uma ilha (Sal), máximo duas (Sal e Boavista) e não de um arquipélago de dez ilhas, e mais algumas ilhotas desaparecidas. É a deformação do turismo de massa, aquele que não visita os lugares , mas "os faz". De fato, ouvirão dizer: " o ano passado estive na Índia, este ano irei a Cabo Verde… Sobre este turismo Cabo Verde, país destituído de qualquer tipo de recurso que não seja através da ajuda humanitária ou das remessas dos emigrados, meio de sobrevivência nos próximos dez anos.

Mas se entrarmos no mérito de "qual turismo", os caboverdianos (governante ou homem comum) caem das nuvens. Como "qual turismo"?. O turismo é somente um: aquele dos Turistas, dos Brancos, dos Ricos! Aquele de quem pode se dar ao luxo, de quem procura conforto e comodidade, de quem não quer pensar em nada, descansar e viver um breve período longe do estresse de casa.

 

Tentem procurar um acampamento, somente um em todo o arquipélago, não encontrarão

Não existe outro turismo senão aquele dos grandes hotéis ou dos grandes resorts. Tentem procurar um acampamento, somente um em todo o arquipélago, não encontrarão. É inacreditável que um Turista, um Branco, um Rico, queira passar suas férias debaixo de uma mísera tenda. As tendas, as casas com teto de palha, são atribuições dadas somente aos pobres…

Fácil criticar, dirão vocês, para quem, nascido num país turístico e, com alguns anos de experiências, acompanhou a evolução italiana dos últimos cinqüenta anos. Mas, longe de nós a idéia de criticar a completa ignorância do mecanismo turístico da parte dos caboverdianos. O que não se sabe, cedo ou tarde, se aprende. Talvez como despesa do próprio bolso, freqüentemente de maneira não indolor. Não é da falta de conhecimento que nos culpamos, mas daquele que suspeitamos ser " interesse de má fé".

 

As outras ilhas do arquipélago, por ora resistem, em sua quase histórica pobreza

Tínhamos em mãos o "Plano Estratégico de Desenvolvimento Turístico para os anos de 2004 - 2010". Este documento, apresentado pomposamente nos primeiros meses de 2004 e rapidamente tirado de circulação (não existe cópia nem na Internet), parece feito propositalmente para que se perpetue a atual situação de desfruto das belezas do País da parte de Tour Operators estrangeiros. Não existem rastros de um programa de desenvolvimento de pequenas estruturas , nem de alguma coisa que possa, perspectivamente, representar uma possibilidade de riqueza para o cidadão caboverdiano.

Parece que a atual situação seja considerada, pelo Governo Caboverdiano, como de otimismo. As grandes estruturas existentes em Sal, aquelas de estão surgindo em Sal e Boavista, oferecem a Caboverde (e aos caboverdeanos) trabalho não qualificado e mal remunerado (de 150 a 300 euros mensais). O turista europeu paga a sua estadia "all inclusive" em Pátria, a um seu cidadão, e em euro. Nenhuma (ou mínima que seja) quantia é repassada para Capoverde senão através de algum jantar, fora do "recinto" , em algum restaurante gestido (coincidentemente) por italianos, portugueses, alemães…

Portanto, seguiremos pela mesma estrada, nos próximos cincos anos! Se e quando abrirá o aeroporto internacional de Santiago, Maio, a dois passos, está prestes a ser a nova vítima da especulação imobiliária e turística… Um grande Tour Operator italiano financiará o aeroporto internacional de Boavista (caso contrário, para que servem os 450 quartos que estão construindo sobre uma das mais belas praias da ilha!). Estará pronto, dizem, em 2006, mas funcionará somente de dia. Considerando as atuais estruturas sanitárias da ilha, estejam avisados: nunca adoeçam de noite! As outras ilhas do arquipélago, por ora resistem, em sua quase histórica pobreza. Nos chegam só os " trekker", os curiosos, os viajantes, mais jovens ou não.
Alguma é também meta de excursões (naturalmente durante o dia. Das 9 da manhã às quatro da tarde! - não vão querer perder um dia de férias "já pago"!), também estas pagas antecipadamente em euro e "com tudo incluso" aos tour operators estrangeiros de Sal e Boavista.

O viajante autônomo, aquele livre de vínculos, aquele que, no mesmo período de tempo, gasta o dobro de quem faz viagem programada, aquele que se adapta, em situações espartanas, em estruturas existentes, aquele que destina seu dinheiro diretamente aos caboverdianos, é totalmente ignorado. O "Plano Estratégico de Desenvolvimento Turístico" não o considera. Não prevê nenhum incremento e, sobretudo, não o deseja. (trad. Anna Grazia Barbaro)

 

Empresários Benfeitores

 

Março 2005 - Cabo Verde

O artigo original tem sido publicado no jornal "A Semana" de 4/2/2005

 

A operadora turistica Turinvest, do grupo italiano Stefanina, apresentou na semana passada o seu projecto turístico para o desenvolvimento da vila de Pedra de Lume, torrão natural do malogrado Ildo Lobo. O italiano Andrea Vita Finzi, um dos administradores da empresa, explicou o projecto a uma plateia da qual constavam o primeiro-ministro José Maria Neves e o Ministro das infra- estruturas e Transportes, Manuel Inocêncio. O projecto que Finzi considerou o major investimento turístico jamais feito em Cabo Verde custará 90 milhões de euros.

O total da área de intervenção do projecto é de 1089 hectares, sendo 850 hectares de terreno edificável, destinado a infra- estruturas e investimentos turísticos. Andrea Vita Finzi explicou a A Semana, entretanto, que a cratera do vulcão onde estão alojadas as salinas - que se pretende tornar em Património Mundial -, será preservada. Assim, a área que compreende as salinas e o Monte Curral, numa extensão de 400 hectares, será designada parque natural e receberá investimentos agro-turísticos.

Vita Finzi fez também questão de esclarecer que as salinas fazem parte do património privado e "legítimo" da Turinvest, inseridas que estão nos 1089 hectares de terreno pertencentes a essa empresa. Mas garantiu que a empresa que representa vai respeitar o direito dos cabo-verdianos a um património que, embora sendo da empresa por direito legal, é histórica e culturalmente de todos os cabo-verdianos.

Por isso, a ideia é garantir a preservação das salinas, mantendo o seu estatuto de potencial património mundial. Também o primeiro-ministro, José Maria Neves, tentou tranquilizar os mais cépticos, dizendo que o interesse dos cabo-verdianos será resguardado e que "as Salinas continuam sendo nossas". O premier felicitou ainda a empresa e a população de Pedra de Lume pelo empreendimento, que, segundo ele, irá proporcionar um desenvolvimento sem precedentes à região, à ilha e ao país.

A população da Pedra de Lume, de acordo com Vita Finzi, só terá ganhar com esse projecto, pois no acordo assinado entre a Turinvest, a CM do Sal e o governo de Cabo Verde, a empresa comprometeu-se a promover cerca de 70 novas habitações para a população local que, assim, poderá contar com condições de vida "infinitamente melhores", além das novas perspectivas de emprego que se abrem.

Também no acordo com o poder local e nacional, mais 10 mil metros de terreno serão salvaguardados para futura novas habitações, deixando mais 3 mil metros para projectos sociais, a serem determinados em concertação com a CM do Sal.

O edil salense, Jorge Figueiredo também não escondeu o seu entusiasmo ante o projecto e considerou que a partir de agora, "teremos uma Pedra de Lume antes de hoje, e depois de hoje". Para Figueiredo, um investimento de 90 milhões de euros, com certeza trará grandes benefícios à ilha e ao país.

E para deixar os "pedralumenses" ainda mais felizes, esse investimento albergará a requalificação do porto da Pedra de Lume, criando condições económicas e de segurança para o exercício da pesca, actividade primária da população da vila.

Os investimentos da Turinvest em Pedra de Lume vão também para a infra-estruturas turísticas, novas redes de esgoto e água, rede telefónica, eléctrica, um centro de tratamento de águas residuais, escola, jardim infantil, uma praça grande e um centro social. Tudo porque, segundo Vita Finzi, a Turinvest "entende as necessidades da sociedade na qual vive".

KS

Rabelados

Fevereiro 2005 - Cabo Verde

Transformaram-se, com o tempo, o símbolo da resistência cabo-verdiana ao regime colonial português. Se para alguns a sua origem remonta aos escravos fugitivos de séculos atrás, na realidade o fenômeno dos "rabelados" iniciou-se por volta de 1940 e nasceu em oposição às novas regras introduzidas com a chegada dos frades da congregação do espirito santo. Com a proibição de certos rituais religiosos e populares praticados na época, uma parte da população revoltou-se contra as novas regras eclesiásticas.

Sucessivamente perseguidos também pelo governo colonial português, aliado da igreja, que via nestes não alinhados" um perigo à ordem constitucional, refugiaram-se entre as montanhas da ilha, sobretudo entre aquelas do distrito Tarrafal, na zona próxima ao Espino Branco (Spinhu Branku). Seria certamente forçoso afirmar que, idealmente, o reservatório humano de onde nasceram os rabelados é aquele dos Badiu, passando para a fase dos Increntes. A bem da verdade, em épocas diferentes e sucessivas: Badiu em oposição à escravidão, Increntes em oposição à Igreja, Rabelados em oposição ao poder colonial.

Desconfiados com os turistas e desconhecidos, difundiram infinitas notícias que, a este ponto não se sabe se são verídicas ou difusas apenas para zombar dos curiosos. Se encontrarem os rabelados, de certo não lhes darão a mão, nem mesmo seus nomes, fingirão não entender o português e chamarão seus filhos quando estes se colocarem em pose para serem fotografados. Se fizerem perguntas às mulheres, estas as dirigirão aos homens para responderem e estes por sua vez aos velhos. A vida do rabelado é limitada pelo que vê e pelo que conhece. O seu mundo é o território onde nasceu e vive: praia, as outras ilhas, a Europa e a América não lhes interessa.

A este ponto, seguros, como somos, de misturar verdade e lenda, relacionamos a seguir o que seriam ou teriam sido as características desta população:
- vivem em cabanas de palha ou com o teto de palha, sem luz, sem água, com o piso em terra batida,
- percorrem longas distâncias para praticar seus cultos no sábado e no domingo,
- nos sábado e domingo não trabalham, fazem jejum e não comem antes das três da tarde
- não bebem alcóolicos, não fumam, não comem carne
- vivem fora do tempo, não houvem rádio e nem televisão, consideradas obras do demônio.
- rejeitam os tratamentos médicos e se curam com sua medicina tradicional denominada de "Lunário Perpetuo",
- recusam também a coleta do sangue, as vacinas e os objetos de metal (também os crucifixos) porque eram de metal os pregos da crucificação,
- resolvem seus problemas e seus escritos quotidianos recorrendo à sabedoria contida na Bíblia e nos provérbios de Salomão,
- guardam com todo cuidado a bandeira de Cabo Verde que, dizem, A. Cabral tinha consigo no dia em que foi declarada a independência (esquecendo que A.Cabral morreu antes daquela dia!),
- confraternalmente são organizados e conservam, como livro guia religioso, o Reliquário Angélico de mons. Joaquim Silva Serrano e o livro de São Cipriano.

Esta é a situação verdadeira ou presumida, mito ou real, fantástica ou verídica. Porém hoje os jovens mal aceitam este modo de viver, sobretudo num período onde não existem mais segregações e perseguições. A nova realidade propõe novos desafios e novos modelos incompatíveis com um fechamento para o mundo, de tal dimensão. É neste contexto que é inserida a presença de Misa', uma artista plástica cabo-verdiana que, oito anos atrás casou-se com a causa dos rabelados, indo viver com eles no vilarejo de Rabu de Spinho Branku. Foram anos de lutas difíceis, mas também de sucessos se, com a ajuda de poucos, tornou possível dotar o vilarejo de infra-estruturas mínimas (água corrente, banheiros, estradas, telefone, dois grandes centos com dez salas para várias atividades).

Após um bom trabalho de sensibilização na área da saúde e após conseguir revitalizar a arte dos rabelados, promovendo o intercâmbio com várias localidades e a exposição de toda sua produção artística, Misá inicia uma nova aventura que é a coroação do trabalho feito precedentemente. O projeto, ambicioso, mas devido aos sucessos precedentes certamente realizável, é aquele da transformação de Rabu de Spinho Branku em um vilarejo multicultural que possa representar toda riqueza artística, o talento artesanal e a identidade cultural de uma comunidade desconhecida aos próprios cabo-verdianos. No projeto Misá, Rabu será "o espaço onde a cultura e a tradição se encontrarão de maneira harmoniosa e onde todos os filhos cabo-verdianos da diáspora, artistas e artesões de vários pontos nacionais e internacionais poderão contribuir para um maior conhecimento da identidade Cabo Verde e participar voluntariamente ao desenvolvimento deste projeto, sendo eles motores e temas".

Acreditamos também que, com a mudança dos tempos, chegou a hora dos rabelados saírem da segregação, de abrirem-se para o mundo externo, conhecerem pessoas de outros países e de outras culturas. Também um turismo inteligente, dormindo nas casas de outros habitantes ou num acampamento (que cedo ou mais tarde surgirá nos arredores), comendo com eles, passeando em suas veredas, compartilhando seus contos e sua cultura, poderia ajudar este povo a confiar no Mundo que os denominou de rabelados sem perceber que, provavelmente, foi ele a perseguí-los e rejeitá-los por décadas . Chegou a hora de colocar um ponto final nesta absurda segregação de uma parte autêntica (talvez a mais autêntica) da população cabo-verdiana.

Contatos e leituras úteis:
Misà (00238) 9918197 - e-mail: [email protected]
Hora de bai - A. M. Sobrero - Ed. Argo 1998

 

Praia da Aguada: o último navio negreiro

Janeiro 2005 - Cabo Verde ( do "diário de um turista" )

De Fogo (fomos à Caldera, aos pés do vulcão), para chegarmos até Praia, tivemos que passar por Brava. O mar é feio, mas sobretudo o pequeno porto de Furna é inadequado. Assim o navio aproxima-se da baía e os passageiros descem e sobem por meio de pequenas embarcações. Perdemos várias horas. Chegamos à Praia depois de 14 horas viagem (tempo real de navegação: 5 horas aproximadamente).

Viajamos com o navio Praia de Aguada. Aquele por mim definido como o último navio negreiro ainda em uso no século XXI. Uma viagem com este navio nos permite entender muitas coisas: o relacionamento do povo cabo-verdiano com o "poder", o sistema opressor de quem o exercita , a incompetência de quem permite estes verdadeiros e próprios abusos - reais limitações das liberdades pessoais. Analisemos uma viagem com este navio que a Arca Verde (a sociedade nacional de Navegação - quase extinta) define como a sua "pupila dos olhos".

Para turistas como nós não se trata de uma horrível manifestação de arrogância e um tapa aos caprichos turísticos de Cabo Verde. Para os cabo-verdianos a demonstração que o próprio governo, além de suas intenções, não consegue defendê-los dos "poderosos" e dos "brancos" (não é por acaso que esta definição em Cabo-Verde prescinde da cor da pele) mal educados e insolentes. Para todos o risco de um acidente: um naufrágio seria para a tripulação e passageiros o que os marítimos definem como "extermínio de ratos".

Não é por acaso que a população cabo-verdiana prefere aguardar, por dias, as mais "humanas" Barlavento e Sotavento, dois navios que reconhecem, com o fim da escravidão, a liberdade e a igualdade de todos os habitantes de Cabo Verde e do gênero humano.

 

Os mistérios de Alcatrazes, a capital perdida

Dezembro 2004 - Cabo Verde

Em 1462 Antonio da Noli desembarcou em Ribeira Grande, levando consigo parentes, amigos, portugueses, genoveses, aristocrátas e a agricultores para dar início à população da ilha de Santiago. O mesmo ocorreu com Diogo Alfonso que estabeleu sua sede em Alcatrazes, na parte leste da ilha.

Antonio e Diogo foram nomeados donatários das duas Capitanias da ilha para desenvolver a agricultura e a pecuária. A história de Cabo Verde já iniciara dois anos antes, quando duas caravelas, comandadas por Antonio da Noli, genovês (quando então fazia parte da República de Genova) patrocinado pela coroa portuguesa e Diogo (um outro Diogo) Gomes, chegaram às ilhas. Quem as avistou e desembarcou primeiro é uma história controversa, mas nós que gostamos mais das lendas do que das histórias, damos preferência à seguinte:

"desembarcaram na baía de Ribeira Grande e ancoraram. Tratava-se de estabelecer quais dos dois capitães desceria primeiro em terra. Tiraram a sorte e Diogo Gomes, foi agraciado a tomar posse daquela terra em nome da Coroa Portuguesa."

No caminho de volta as caravelas tiveram outra sorte e foram diversamente favorecidas pelos ventos. Antonio da Noli foi primeiro a chegar em Portugal que, declarando ter encontrado as ilhas, tornou-se o descobridor oficial. O consueto e esperto genovês/italiano? Parece mesmo que sim.

Após dois anos, Antonio da Noli e Diogo Alfonso se estabeleceram nas ilhas, fundando as respectivas capitais. De Ribeira Grande muito se sabe, se não tudo, mas quase (uma boa síntese é encontrada na página da web http://www.cvfaidate.com/ribeira.htm). Entretanto de Alcatrazes, quase nada. Não somos historiadores mas, por curiosidade, as únicas notícias que conseguimos obter nos leva a saber que em 1513, devido a insalubridade do local iniciou-se gradualmente ao abandono de Alcatrazes e seus habitantes transferiram-se, na grande maioria, para Ribeira Grande.

1462-1513: 50 anos de vida! Não são muitos, mas nem tampouco pouquíssimos. Será possível que daquela experiência não restou nada? Será possível que sobre a localização de Alcatrazes não se vai além de um genérico " nas proximidades de Praia Baixo"? Após alguns insucessos finalmente conseguimos, em Praia Baixo, encontrar uma senhora que tinha a lembrança de que seu pai chamava uma baía próxima de "Baía de Alcatrazes". Pedimos que nos indicasse e hoje, quase certamente, temos condições de fornecer aos futuros turistas ou estudiosos, indicações para alcançá-la.


Chegando em Praia Baixo, virem à esquerda em direção do Praiabaixo Aparthotel e, antes da construção hoteleira (onde a estrada acaba na praia), pegue a travessa à esquerda. Passarão diante de casas enfileiradas e, dois quilômetros depois, estarão em a Castelo Grande. Não há nenhum castelo (quem sabe de onde se origina o nome!) mas, deixando o carro, poderão ver una pequena colina à sua frente (o Pico) e, bem no alto, em direção às montanhas, aquela que parece uma construção fortificada e no entanto é uma formação natural (denominada "duas orelhas").

Em seguida, a pé, seguirão à beira do rio e, chegando ao mar, subirão até a planície à esquerda. De lá terão um panorama incrível.Este é o lugar onde, provavelmente, surgiu Alcatrazes. Uma língua de terra erguida entre duas ribeiras, formando lateralmente duas arribadas protegidas pelo vento.

A Cooperação Espanhola está fazendo um bom trabalho para a recuperação de Ribeira Grande (hoje Cidade Velha). Temos certeza que não vale a pena escavar também aquele promontório à procura de Alcatrazes?

 

Os mistérios do aeroporto de Praia

Novembre 2004 - Cabo Verde

Cabo Verde, talvez um caso único no mundo, pois não possui um aeroporto internacional na Capital. O único que se privilegia com esta denominação, e no qual podem aterrissar grandes aeronaves, encontra-se em Sal, outra ilha do arquipélago distante, com uma área de mais de duzentos quilômetros.

Nos anos 80 o governo decide acabar com esta anomalia e inicia a construção do novo aeroporto de Praia. No entanto, os governos se sucedem, de 1991 à 2001 (por duas legislaturas) governa o MPD, de inspiração liberal; em 2001 volta ao poder o PAICV, primeiro partido único e agora de esquerda. Se perguntarmos a um caboverdiano o porque do atraso incrível da abertura (e dos trabalhos) do aeroporto, nota-se uma incontrolável voz sobre a ineficiência e desvio de financiamentos destinados para a causa em questão. Nada a esse respeito (parece) seja verdade.

A única anomalia é "técnica" (assim é divulgado pelos jornais). Houve um erro de cálculo, a prevista "sala Vip" para os vôos internacionais e sobre a trajetória das aeronaves em pouso, resultou a um custo elevadíssimo. Uma reunião em Sal (porque em Sal?) entre comitentes e empreiteiras tudo se resolve. Se recomeça. Estamos em 2002.

O tempo passa. '" o caboverdiano" se pergunta, com idéias das mais estranhas. Do tipo: "existiriam pressões dos operadores turísticos de Sal contra a abertura do novo aeroporto?". De fato, a dúvida, por quanto provavelmente infundada, é legítimo. Todos sabem que o Turismo em Sal está completamente nas mãos de operadores estrangeiros, sobretudo italianos (popularmente, um é chamado até de "o rei de Sal").

No entanto, surgem em diversos jornais: aquele governativo, aquele de oposição e aquele mais acentuadamente independente, algumas notícias que damos a seguir: o aeroporto abrirá em 2003, abrirá na primavera de 2004, abrirá antes do final do ano. Estamos nos dias de hoje. Horizonte, edição semanal governativo, de 15 de outubro passado, após ter feito uma correta e sucinta cronistoria da controvertida iteração do novo aeroporto, declara:

"a obra deveria ter sido concluída em junho de 2004, conforme anunciado pelo governo, devendo ser inaugurado, talvez, no final do ano. Todavia, é certo que a abertura para o funcionamento desta infraestrutura muito esperada, não só pelas companhias aéreas, mas também pelos investidores e operadores turísticos, se dará somente em 2005."

A este ponto, " o caboverdiano" entendeu tudo. Está tudo bem claro. Não se pergunta mais nada. As Eleições Políticas estão previstas para Janeiro de 2006, Santiago possui mais da metade dos habitantes do arquipélago, a Praia sozinha possui mais de um quarto. Está tudo claro. Até demais.

Nota: O aeroporto foi aberto no dia 6 de outubro 2005. Em janeiro o partido no poder (PAICV) ganhou outra vez as eleições.

A&A (mail: [email protected])

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