O Ponto de Encontro - Banner
Home Livros  Arquivo Retratos Poemas (Pedro Tamen)
 

 

A minha morte, não ta dou.

A minha morte, não ta dou.
De resto, tiveste tudo
- a flor, a sesta, o lusco-fusco,
a inquietação do dia 8,
as órbitas das mães, das mãos,
das curiosas palavras de não dizer nadinha.
Tudo tiveste: estás contente?

Feliz assim por teres tudo o que sou?
Feliz por perderes tudo o que sei?

Só não te dou o que não serei.
Não, a minha morte, não ta dou.

La mia morte, non te la do.

La mia morte, non te la do.
Del resto, hai avuto tutto
- il fiore, la siesta, l'imbrunire,
l'inquietudine del giorno 8,
l'orbita delle madri, delle mani,
delle curiose parole di non dire niente.
Hai avuto tutto: ne sei contenta?

Felice così di avere tutto quel che sono?
Felice di perder tutto quel che so?

Solo non ti do quel che non sarò.
No, la mia morte, non te la do.

 

Sonho-te real, em lágrimas de mar

Sonho-te real, em lágrimas de mar,
refaço as mãos, tuas raízes verdes,
conto e reconto as horas que passámos.
Repiso os passos, rasgo a estrada branca,
renasço em cada gesto que fizemos,
beijo-te outra vez, ajoelhado...

Enquanto longos, dolorosos versos
nas veias vão doendo

Ti sogno reale, in lacrime di mare

Ti sogno reale, in lacrime di mare,
rifaccio le mani, tue verdi radici,
conto e riconto le ore che abbiamo passato.
Ricalco i passi, squarcio la strada bianca,
rinasco in ogni gesto che abbiamo fatto,
ti bacio di nuovo, inginocchiato...

Mentre lunghi, dolorosi versi
dolgono nelle vene

 

E é a tua sombra, e é e se desfaz

E é a tua sombra, e é e se desfaz,
se faz raiz e grão
no que te tenho aqui.
O dedo de penumbra que me dás
aumenta a minha mão
e tem-me em ti.

Chocalha agora a tarde nas coleiras
de ovelhas indiferentes;
tudo com elas fica, e as oliveiras,
não vistas, mas presentes.
Abafo-me com isto; ao seu calor
o nosso sangue é um e amadurece.
Boa-noite, meu amor.
Boa-noite, que amanhece.


Ed è la tua ombra e si disfà

Ed è la tua ombra e si disfà
si fa radice e grano
in quel che qui ti tengo.
Il dito di penombra che mi dai
aumenta la mia mano
e in te mi tiene.

Tintinna adesso la sera nei collari
di pecore indifferenti;
tutto con loro resta e gli olivi,
non visti, ma presenti.
Mi copro di questo; al suo calore
il nostro sangue è uno e matura.
Buona notte, amore mio.
Buona notte, che rischiara.

Escrevo-te de perto, como se a mão

Escrevo-te de perto, como se a mão
te fosse objecto breve aflorado,
como se da rua te chegasse
a certeza pequena para a compra
dos minutos seguintes. De perto
como o sol, como a cigarra.
Como um silêncio cheio
que te viesse aos olhos de manhã
e amar-te fosse a roupa
escolhida ao começar o dia.

Ti scrivo da vicino, come se la mano

Ti scrivo da vicino, come se la mano
ti fosse oggetto breve affiorato
come se dalla strada ti arrivasse
la piccola certezza per la compera
dei minuti seguenti. Da vicino
come il sole, come la cicala.
Come il silenzio pieno
che ti venisse agli occhi di mattina
e amarti fosse il vestito
scelto al cominciar del giorno.

 

E nisso haver. E nisso persistir.

E nisso haver. E nisso persistir.
Pensar perder-me em nada diluído
pela bola de neve que me desses
instantânea mas branca. Conseguir
amores de bruma e de estampido
num espaço que não sei e onde teces
a tua tempestade.

Correr a mão
pelo corpo que tens em tempos quedos,
deixá-la ir pelos agostos fartos
pelas horas de ceifas e de verão.
Deixar que a tua pele me guie os dedos
para chegar aos olhos e fechar-tos.

Os Nautas

Quando até sobre o tarde navegavam
a luz que dentro vinha sobrepunha
a lantejoula aguda de outro sol
ao passo opaco, idêntico, cercando
os braços intranquilos, a surpresa
que só de pressentida lhes doía.

Ao frio sal que sob os pés sentiam
e à escuridão mais fundo, ao sonolento
e bruto som da corda e da madeira,
às dores de fome e ao gemido fraco
duma saudade parda, à solidão
sem espelho, à gula insaciada, ao medo

- a tudo combatia uma paixão
neles tão nova, nevoenta outrora,
qual a de ver, de ver de olhos abertos
até sentir no roçagar dos dedos,
a mínima paisagem, mais total
que os montes lerdos, pátrios e trocados:

a crispação da vela, o peixe lento
de súbito surgindo, ignotas flores,
cores purulentas, vasto e escasso espaço
para estrídulos pássaros abertos
e outra vida mor,
e ainda bruma
que não sabem se é deste ou doutro sonho.


O mar é longe,mas somos nós o vento

O mar é longe,mas somos nós o vento;
e a lembrança que tira,até ser ele,
é doutro e mesmo,é ar da tua boca
onde o silêncio pasce e a noite aceita.
Donde estás,que névoa me perturba
mais que não ver os olhos da manhã
com que tu mesma a vês e te convém?
Cabelos,dedos ,sal e a longa pele,
onde se escondem a tua vida os dá;
e é com mãos solenes,fugitivas,
que te recolho viva e me concedo
a hora em que as ondas se confundem
e nada é necessário ao pé do mar.

Voltar à página principal (em português) | Tornare alla pagina principale (in italiano)
Para sugerir um site | Per suggerire un sito
Falemos | Forum